terça-feira, outubro 28, 2003

Esse sorriso...

Uma das minhas manchas traz um sorriso agarrado.
Esse sorriso...
Às vezes, perdida entre o endiabrado puzzle das minhas manchas, esqueço-me de sorrir.
Mea culpa, digo eu, mas na verdade não me culpo. Quis a minha sina que me calhasse em sorte ter ao lado o teu sorriso e com ele me compenso de todos os momentos em que me esqueço de me deixar, simplesmente, arrastar pela corrente da tua alegria e do teu entusiasmo, da tua vontade de estar bem contigo e com os outros.
No meu manchado universo, esse sorriso com que me presenteias é uma bênção que talvez não mereça, porque não sorrio o bastante, porque só me lembro de o fazer no espelho da tua boa disposição. E depois? Mesmo que não o mereça, por que razão o desperdiçaria? É para mim e não está em mim fazê-lo mudar de direcção.
Venha então daí esse sorriso e o imenso prazer que me proporciona.
Até acredito que Deus, a existir, me levaria muito a mal que descartasse em sentimentos de culpa e de diminuida auto-estima o teu sorriso. Deus, a existir, leva a mal com certeza que nos queixemos com tanta assiduidade e depois nos neguemos a liberdade de aceitar e tomar o que generosamente nos põe à  frente do nariz.
Por isso, merecido ou não, o teu sorriso é meu. E com ele me comprazo entre as cedências feitas à tentação do mau feitio, do pessimismo e outros ismos de sinal negativo.
Com o teu sorriso resgato-me às marés negras, aos arrufos, à inveja, à  irritação, às mesquinhices das minhas manchas de carácter.

Olha, sorriso, anda daí, vem comigo até à  praia. Quero confessar-te, à  frente de uma chávena de café fumegante e com o mar como testemunha, o quanto me deleitas e me agradas e me transformas, até que nada mais exista senão a gostosa sensação de te ter por perto e a permissão concedida a mim própria de te fruir livre e despreocupadamente.

Deus, a existir, nunca me perdoaria se olhasse para o lado e evitasse o teu sorriso.

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